30 de agosto de 2010

Vandalismo


Meu coração tem catedrais imensas,
Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Canta a aleluia virginal das crenças.

Na ogiva fúlgida e nas colunatas
Vertem lustrais irradiações intensas
Cintilações de lâmpadas suspensas
E as ametistas e os florões e as pratas.

Como os velhos Templários medievais
Entrei um dia nessas catedrais
E nesses templos claros e risonhos…

E erguendo os gládios e brandindo as hastas,
No desespero dos iconoclastas
Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!


_________________________Augusto dos Anjos

29 de agosto de 2010

"Não sabemos da alma senão da nossa;
As dos outros são olhares,
são gestos, são palavras,
com a suposição
de qualquer semelhança
no fundo."
____________Fernando Pessoa

27 de agosto de 2010

Às vezes eu tenho a impressão de que
alguns sorrisos são ondas que começam no coração,
brincam de sol nos olhos e, instantaneamente,
levam clarão para a boca, para o rosto todo,
para a vida inteirinha.

18 de agosto de 2010

" Estou sozinha e nunca aprendi a estar sozinha.
Estou sozinha e sinto falta de palavras... estou sozinha.
Estou sozinha e sinto falta de uns olhos onde possa imaginar...
Estou sozinha e sinto falta de mim em mim..."

15 de agosto de 2010

É bonito construir pessoas, na imaginação.
Umas têm histórias, outras só futuro; umas feias,
outras um ponto escuro; umas com parentes por todo lado.
Gosto de construir pessoas, na imaginação.
Só para poder matá-las, uma a uma ...

13 de agosto de 2010

O tempo e as jabuticabas

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver
daqui para frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquela
menina que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ela
chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.
Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir
quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos.
Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos
para reverter a miséria do mundo. Não quero que me convidem
para eventos de um fim de semana com a proposta de abalar o milênio.

Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir
estatutos, normas, procedimentos e regimentos internos.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas,
que apesar da idade cronológica, são imaturos.

Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões
de 'confrontação', onde 'tiramos fatos a limpo'.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo
majestoso cargo de secretário geral do coral.
Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: 'as pessoas
não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a
essência, minha alma tem pressa...
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente
humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta
com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não
foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados,
e deseja tão somente andar ao lado do que é justo.

Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, desfrutar desse

amor absolutamente sem fraudes, nunca será perda de tempo.'

O essencial faz a vida valer a pena.


Rubem Alves